domingo, 15 de novembro de 2009

"Devaneio dum momento de paixão"


Fim da tarde.
O sol já se escondia.
O mistério da noite começava então a sentir-se,
no ambiente calmo, sereno e tranquilo à beira mar.
Havia um perfume de volúpia maresia.

Estavam sós.
Sem horas marcadas para aquele encontro.
O tempo era só um – aquele momento.
Num espaço centrado ali, envolta daqueles dois seres.
Ele sorria-lhe de desejo e luxúria.
Ela olhava-o com um olhar sedutor e convidativo.

Num silêncio cativante,
a química aferventou numa atracção harmoniosa.
Os corpos aproximaram-se,
e suas bocas tocaram-se…
Beijos ávidos e quentes,
com palavras sussurradas de ardor e desejo.

Endoidecidos de prazer pediam mais… e mais…
Gemidos envoltos de desejo e sofreguidão…
Dois animais famintos de sexo.
Numa luta de corpos sedentos de desejo,
as línguas se tocavam
e percorriam todas as entranhas do corpo um do outro.

Havia risadas de gozo e de prazer.
Eles brincavam com a própria excitação do jogo do desejo.
Gestos, olhares, sussurros, respiração…
A paixão e a volúpia
transformavam-se em néctar lubrificante na vagina dela,
e em seiva no pénis dele.

Deleitosos, húmidos, aprazíveis…
no ponto certo para se encaixarem
e tornarem-se em um só – num só ser,
numa só carne, num só tesão.
E assim foi, porque irresistivelmente tinha que ser.
Enquanto o mistério do silêncio os aproximava ainda mais.

Nos seus rostos colados,
mergulhava um olhar difuso de pupilas dilatadas,
fazendo-se ecoar o bulício dos seus fôlegos.
A respiração era agora só uma – ritmada, fulgurante…
enquanto os sexos se penetravam…
Ele agarrava-lhe os seus longos cabelos castanhos macios e lhe sorria,
dizendo o quanto a desejava e como era bom fazer amor com ela…
E ela correspondia - sorria-lhe de gratidão…

Intensamente gozavam o prazer do jogo do sexo a dois.
Sedentos, sôfregos, ávidos…
num ritmo infinito de prazer, de força, e vigor.
E gemiam, gritavam…
Pediam mais e mais, até à loucura da exaustão
onde a mente, corpo e alma se difundiam
no sentimento mais aprazível de existir e de se Ser.

Subitamente o céu abaixou à Terra,
envolvendo-a numa êxtase de enorme ebulição.
A lua ficou mais redonda, cheia de brilho e luar.
As estrelas começaram a girar de forma descoordenada
em volta do planeta e do sistema solar.
Uma explosão intensa de sentimentos e emoções, no seu ápice!

E…
num culminar, um silêncio absoluto se fez.
Dois corpos cansados
relaxam agora no júbilo da noite serena, à beira mar.


Maria Cristina Quartas

2009

"Dialéctica"

Lá fora,
chovem gotas de ira
que penetram na terra devorasmente.
No solo corre o sangue da fúria
dos cadáveres mortos nesta aniquilação.

Lá fora,
as papoilas murcharam
e os pardais foram encarcerados.
Nada resta na natureza,
a não ser
capacetes marciais e…
alguns restos (já em putrefacção)
de algo chamado “Homem”
- aqui e além uns miolos e uma mão
esticada pedindo paz.

Lá fora,
tocam as cornetas
e já não há marchas.
Porque o som das cornetas
são gritos de desespero,
que fazem os esqueletos taparem
os ouvidos ou a saírem deste planeta.

Lá fora,
o epipétalo já não é mais estame,
mas bomba nuclear,
onde cada um espera colher o pólen,
para a sua própria sobrevivência.

Lá fora,
fazem abortos dos humanos
e fazem monstros em provetas,
e deixam parir os animais…
Selva tão coordenada…
Quem manda é o leão!

Lá fora,
há já um projecto para uma estátua
dum soldado desconhecido
e sepultam tantos esquecidos!

Lá fora,
é o século das luzes…
Oh, raio de vida,
que me pariste
na maior escuridão dos milénios!

Lá fora,
os defuntos vestem de luto.
Aqui,
Eu visto de branco.

Maria Cristina Quartas

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

"Da janela do teu quarto"

Da janela do teu quarto,
quando o sol se põe
entre as entranhas dos montes
e por entre o emaranhado das nuvens do céu…
quando na magia do entardecer no cinzento manto
se pinta de azul e de cor d’alvorada…
Eu vou te olhar no teu olhar.

Da janela do teu quarto,
quando a ria transborda melancolia e saudade
e alaga no sentimento a fantasia
e enche um coração de sonho e ilusão…
quando de mansinho as ondas embalam as águas paradas
e um pequeno remoinho as faz vibrar…
Eu vou te sentir na tua alma.

Da janela do teu quarto,
quando a brisa suave deslumbra o sabor fresco
e o cheiro quente da terra a adormecer…
quando o aroma da miragem te envolve…
Eu vou te sentir no cheiro desse perfume.

Na janela do teu quarto,
na hora do anoitecer
abrem-se luzes d’arribalta
para Sereias, Ninfas e Musas aparecer.

É pela janela do teu quarto na hora do entardecer
que vou ao teu encontro para te Amar
com todos os meus sentidos!...

Maria Cristina Quartas
20/Set/2009

domingo, 8 de novembro de 2009

Falemos de sexo sem tabus: "Fazer amor com sexo ou fazer sexo com amor"

Por Maria Cristina Quartas
Hoje vamos conversar um bocadinho sobre sexo...
O homem das civilizações mais primitivas tinha uma ideia completamente diferente da nossa no que se refere ao sexo.
O sexo era usado instintivamente de dois modos fundamentais: como meio de auto-reprodução e de multiplicação da espécie; e como meio de se realizar o ímpeto atractivo entre duas polaridades opostas, por uma necessidade fisiológica.
O sexo sempre foi algo muito valorizado pela sua importância. Sabe-se que nos agrupamentos humanos primitivos a grande maioria dos rituais era ligada à magia sexual. Por isso existem em ruínas figurações do "falus" (= órgão sexual masculino) pelo seu valor de representação prática para a sobrevivência das espécies, sob todos os pontos de vista.

Já no homem mais evoluído o sexo é utilizado sob duplo aspecto: prazer e reprodução.

Por um lado, o sentido prático da reprodução, e por outro, o lado mágico imposto pelo mistério que era o nascimento de um novo ser. Portanto, os cultos fálicos não eram dirigidos à motividade, mas sim à fecundidade, pois, se abolissem o sexo, por certo não haveria descendentes, e uma tribo pequena era presa fácil para as outras maiores.

Durante séculos, o sexo para a mulher foi visto como forma de reprodução e só. Não restando a ela outra função para o acto, tendo em vista que o prazer feminino era reprimido ao extremo.
Assistimos hoje em dia a mudanças, que diria quase radicais, no que concerne aos conceitos da sexualidade da mulher.
Graças à informação a que todos têm acesso, o sexo passou a fazer parte do quotidiano, não ficando limitado apenas à concepção, mas fazendo com que a mulher se sentisse valorizada e que a sua auto-estima fosse elevada.
Sem pretender ser discriminativa, penso que essa revolução é mais verificada e acentuada nos conceitos da mulher do que no homem, no que respeita à sua aceitação, libertação e postura perante o sexo oposto. Já há muito o homem desejava uma postura diferente na mulher.
Embora, a nossa educação e cultura fizesse sempre predominar os conceitos e valores ligados (em grande parte) à religião e aos conceitos de “Mulher” na nossa Sociedade.
A postura do homem tem sido, ao longo dos tempos, muito mais natural e diria menos hipócrita. Assumem muito mais que a mulher a sua necessidade fisiológica e envolvem-se muito mais, duma forma mais declarada na conquista e obtenção do prazer carnal.
Fazem-se muitos julgamentos acerca da postura do homem, relativamente a ele procurar outras mulheres além daquela que escolheu para sua “donna”.
Pois bem, será caso para perguntar, porque faz ele isso? Será que o faz para se afirmar “macho-viril-potente” ou a sua companheira não o realiza devidamente nas proporções necessárias à sua realização sexual? De qualquer forma, sabemos que os conflitos causados por esse tipo de situações nada são agradáveis (numa sociedade em que predomina a monogamia) e que naturalmente é sempre almejado a harmonia entre o casal.

Muitos são os factores que duma forma directa ou indirecta contribuem para a emancipação e libertação da mulher hoje em dia. Aspectos relacionados com a organização social, as normas culturais e morais, a conjuntura histórica e a expectativa dos papéis sexuais… Permitem à mulher uma maior independência e autonomia que lhe favorece novas maneiras de pensar, de ver e de estar no mundo.
Desta forma, muitos mitos e preconceitos que envolvem o acto sexual em si, tenderão a desaparecer para dar um novo conceito de Mulher.Um outro fenómeno social que está a emergir tem a ver com a “temporalidade das coisas”. Estamos numa Era Moderna, a qual se caracteriza por uma "sociedade de consumo” – um consumismo rápido. O homem vive pelo prazer imediato das coisas, sem estar a fazer futurologia ou a pensar no dia de amanhã. As coisas e as acções tendem a ser temporais e não eternas.

Até o “amor romântico” já está a cair em desuso. Pois segundo os ideais do romantismo um amor deveria ser perpétuo…




Hoje em dia nada mais é eterno. Tudo é temporal e casual.
Há quem diga, que assim se vive melhor e se goza mais a vida, tirando dela o que a cada momento nos aparece de bom (como se cada momento fosse o último da nossa vida).
Considero assim, que temos necessidade de actualizar os nossos padrões de vida e modos de vivência.
Urge repensar os conceitos de sexualidade da mulher. E principalmente aquelas que passam por situação de divórcio, porque após a sua separação vão encontrar um mundo completamente diferente do que estavam habituadas e para o qual foram educadas.
Carentes, vulneráveis, fragilizadas… saídas duma relação que viveram durante anos, numa convivência menos aberta e, se não, tantas das vezes, uma experiência de castre e de renegação… sentem-se agora mais esperançadas em encontrar um rumo mais certo para as suas vidas, caem facilmente em promessas falseadas de homens menos escrupulosos. As suas expectativas são altas naquilo que almejam encontrar e, perante os piropos e lisonjeios, criam sentimentos exacerbados de ilusão e paixão.
É comum assistirmos ao erro de, passado pouco tempo, estarem a envolver-se afectivamente com alguém. E é sentença lida, que após algum tempo, as lágrimas voltam, pelo desencanto da desilusão e pela frustração de mais uma relação fracassada.
A fase pós divorcio deverá ser vivida da forma mais serena possível e com a introspecção necessária ao amadurecimento e reconstrução interior.
Obviamente, só poderemos gostar de alguém duma forma saudável se nos sentirmos bem connosco próprios, seguros, e autónomos – ou seja, equilibrados.
Sendo o sexo extremamente importante quer a nível físico e psicológico, para o equilíbrio, bem estar-estar e confiança da mulher, ela tem que estar preparada para enfrentar novas relações.
E quando se recomeça uma nova vida activa é preciso que a mulher seja bastante honesta com ela própria: ou procura uma relação sexual ou procura um relacionamento afectivo.
Sabemos que ambos são possíveis em simultâneo, mas há que começar por algum lado.
Pode-se ter vários tipos de relações com pessoas diferentes. Uns serem só amigos, outros grandes amigos, e outros ainda, amigos “coloridos”. Isto enquanto não se encontra a pessoa certa (a seu tempo ela aparecerá com certeza) para um relacionamento mais profundo de compromisso.

Os homens gostam que as mulheres assumam a sua sexualidade. E, por outro lado, faz com que elas se sintam mais autênticas e confiantes.
O sentimento de admiração que um homem sente por uma mulher pela forma como ela se assume já é, por si só, uma forma de afecto e que gera um grande grau de respeito.
Saber discernir o que pretendemos antes de mais e depois saber fazer a selecção dentro daquilo que queremos. E nunca esquecer, são as mulheres que escolhem o companheiro sexual. Sempre! E não ao contrário como se diz por aí.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

"A noite das bruxas"

Num sítio ermo em Baltar, entre vales e veredas, lá para os lados de Vandoma, o encontro estava marcado para aquela noite.
A noite começou a baixar a pouco e pouco. Na magia das sombras das trevas o feitiço se deu. Roupa lúgubre, chapéu de bico alto e abas preto, botas de biqueira fina… Era obrigatório comparecer conforme mandava o figurino.
Na escuridão da noite e no meio da neblina surge um portão enorme de ferro que se ia abrindo conforme os convidados iam chegando.
Por um caminho sinuoso, archotes e velas iam demarcando em direcção à Gruta…
Hipnotizada pelo encanto da magia da noite das bruxas fui levada àquele lugar retirado e recôndito.
Uma Caverna soturna me esperava.
Chegada finalmente à cavidade da Gruta sobre o manto negro…
À entrada, velas e caveiras nos recebiam. Lá dentro uma música soturna e diabólica nos convidava a entrar.
Entrei.
Uma enorme teia decorava o meio da sala. Aranhas, corvos e morcegos, cobras e lagartos… baba de serpentes escorriam nas paredes… defuntos pálidos prostrados espalhados pelos cantos…lanternas tortas de ferro enferrujado iluminavam as sombras bizarras que desenhavam silhuetas de corpos deformados.
O espaço era assombroso e ao mesmo tempo fantástico. Quase parecia real e que duma forma surreal levava a qualquer um a desbravar minuciosamente aquela escuridão.
As sombras aos poucos e poucos iam-se definindo por entre aquela luminosidade. E as bruxas iam aparecendo.
Era chegado o momento marcado para o encontro das bruxas. Bruxas feias, bruxas más, bruxas ruins…
A festa ia começar.
Com a musica mirabolante elas dançavam, cantavam, gargalhavam-se e espoliavam-se….
As caldeiras coziam em fumaça e as fumadas se faziam… Arroz de penas e bicos de aves, tarte de vísceras e dejectos de gafanhotos e sardaniscas… pataniscas de pelos de tarântulas, perninhas de aranhas fritas… bola de línguas e orelhas de cobra e de lagartos… rissóis de unhas e cabelos de cotovias velhas…sangue de morcego, urina de cavalo….
Após a ceia foi lida a ordem dos trabalhos das bruxas.
Por entre corredores estreitos seguiu-se em direcção aos fundos da caverna ao encontro dos Oráculos.
Búzios, cartas, bola de cristal e quiromancia. Entre si as bruxas se consultavam e faziam as suas profecias.
Falavam dos desamores, das desventuras e desilusões… e previam piores dias nas suas confissões.
Cansadas, exaustas, esgotadas…por entre as sombras da noite iam-se diluindo em regresso aos seus lares.
2h30.
Tirei o chapéu, tirei as botas bicudas, despi a roupa que trazia. Tomei um duche e deitei-me.
No conforto do meu leito, no escuro do meu quarto, entre as sombras imaginárias voltei de novo àquele lugar … para repor todo o mau-olhado que tinha trazido comigo.
Adormeci.

Maria Cristina Quartas

Nota: Obrigada querido "J" por me teres levado a este mundo fantástico.

domingo, 1 de novembro de 2009

"Festum omnium sanctorum "

Numa sociedade materializada em que não há tempo para os afectos, nem para as manifestações de sentimentos de amor, de amizade, de respeito, de partilha, de estima... Numa sociedade em que se esquecem as pessoas ainda vivas... o culto da morte é um acto colectivo, que parece querer relembrar a importância do outro nas nossas vidas. E por conseguinte, a importância da própria vida.
Algo controverso e ambíguo: se por um lado não lembramos, por outro não queremos esquecer.
Parece que a morte, é um processo que nos traz à consciência a importância da vida.
Por outro lado, ao rejeitarmos a morte e a tornando tabu, estamos a renegá-la.
Ela é o acontecimento que mais sofrimento provoca no ser humano. A separação, a despedida, a saudade, a solidão, o fim de tudo...criam angustias tais, que os nossos meios de defesa e de pensamento racional não conseguem suportar e entender. Por isso (duma forma inconsciente) esquecemo-la. Cria-se o tabu.
O culto dos morte, embora seja um atitude individual é um acto de cultura social-religiosa.
Apesar de acreditar convictamente na continuidade da vida, na existência do espírito… costumo dizer: Dêem-me flores em Vida. Cobram-me de flores e de beijinhos. E quando morrer, queimem o meu corpo efémero e deitem-no ao vento para fertilizar as plantinhas.

Maria Cristina Quartas